quarta-feira, 13 de junho de 2007

Uma pitadinha de Karl Marx

Muitas pessoas falam sobre Karl Marx: umas calorozamente, outras mais calmas; umas de forma saudosista, outras de forma atual; umas cheias de admiração, outras cheias de repulsa; umas falando a favor, outras falando contra. Mas uma coisa que eu sempre percebo nessas falas é uma confusão de "Marx isso" e "Marx aquilo", quase nunca com consistência; por isso, resolví falar um pouco do Mouro (para quem não sabe, esse era um apelido familiar dele), não por ser muito entendedor do Marxismo, mas por já ter debatido com todos aqueles tipos de pessoas que enumerei acima. Vou ser pontual e específico, para tentar dar a maior objetividade possível a esse texto.
Primeiramente, quem foi Karl Marx? Bom, Marx foi um cara barbudo e muito pobre, que viveu no século XIX, terceiro filho, nascido em 1818. Marx acreditava, desde jovem, que o homem teria sua felicidade ao trabalhar em prol da sua coletividade; é importante aqui perceber o rede que isso forma, pois dentro dessa coletividade não se anulam os indivíduos, pelo contrário, se reforçam, pois nos mais variados gostos e habilidades suprem-se as necessidades de todos, cada qual fazendo o que gosta e o que pode. Marx estudou, entre 1835 e 1836 na Universidade de Bonn, e em outubro de 1836 mudou-se para Berlim, matriculando-se na universidade de Berlim, onde conheceu o pensamento de Hegel e os hegelianos de esquerda. Marx foi redator de alguns jornais e revistas ao longo da vida, e foi em uma redação que conheceu aquele que seria seu eterno parceiro: Friedrich Engels. Marx sabia que a sociedade capitalista não fazia os homens felizes e plenos, e portanto deveria ser substituída por algo melhor. No socialismo encontrou o início da resposta que demorou toda a vida para elaborar, e mesmo assim nem perto chegou de matar o problema.
Esclarecido um pouco sobre a vida de Marx, vou falar de seus conceitos e teorias.
Uma que sempre vejo ser mal-interpretada, mais no meio acadêmico, é a ideologia. Baseados mem algumas passagens da obra "A Ideologia Alemã", as pessoas afirmam categoricamente que ideologia é "o conjunto de idéias da classe dominante, que faz-se passar por idéias de toda a sociedade"; assim sendo, toda e qualquer classe não-dominante não possui ideologia, sendo essa de propriedade exclusiva da classe dominante. Eu acredito que essa definição seja um erro, pois tudo aquilo que já lí de Marx (e, infelizmente, nessa lista não entram todas as páginas de "A Ideologia Alemã") aponta para a definição de ideologia como um conjunto de idéias, ou melhor, como um conjunto das formas de representação da realidade que os indivíduos proclamam ou praticam em seus comportamentos. Uma coisa clara para constatar isso é observar que o próprio Marx nunca se refere a ao conjunto de idéias da classe dominante por "ideologia", mas sim por "ideologia da classe dominante" ou "ideologia dominante"; se existe uma ideologia da classe dominante, temos duas opções: aceitar o termo como pleonasmo, ou aceitar que existe uma ideologia das classes dominadas. Eu fico com a segunda opção (e só para dar maior legitimidade, Leandro Konder, em "Marx - Vida e Obra", também).
Outro erro que vejo acontecer muito, e não só com Marx, é tentarem pegar o que ele escreveu e aplicar diretamente em nossa realidade. Marx acreditava piamente que a sociedade capitalista cessaria de existir enquanto ele ainda respirasse, pois, para ele, o proletariado era a única classe na história que era revolucionária em sua essência, ou seja, só por ser proletário já era revolucionário, e ao estudar a sociedade capitalista (e ele fez isso exaustivamente), Marx percebeu que ela estava em uma crise profunda, dirigindo-se ao colapso. Portanto, os estudos de Marx foram verticais, ou seja, ele se fixou no tempo-espaço (a Europa de sua época) e procurou entender a sociedade, pois entendendo-a poderia transformá-la, e esse conhecimento ajudaria na tarefa do proletariado. Portanto, os estudos de Marx dizem respeito a uma sociedade muito diferente da nossa; mas isso não significa, como pretendem alguns, que Marx esteja ultrapassado: embora diferente, a sociedade estudada por Marx é o pilar, a origem da nossa sociedade atual. Então, ainda temos muito a aprender com os estudos do Mouro, mas sempre procurando interpretá-los no contexto que foram produzidos, comparando com a nossa realidade.
Quero também falar um pouco sobre o marxismo (que, pasmem, não é sinônimo de "Karl Marx"). Uma das frases que mais gosto de Marx é exatamente sobre o marxismo; Marx fez e faz escola, mas, vendo quem eram e como agiam os marxistas de sua época (e ainda agem os de hoje), Marx disse algo como "Se isto que aí está é o marxismo, eu, Marx, não sou marxista". Isso soa engraçado em um primeiro momento, mas é algo que se deve analisar com calma. Pelo que pude perceber, Marx nunca desejou a existência de marxista, mas queria que seus estudos fossem aproveitados por todos os operários para derrubar a burguesia; mas, em nome do marxismo, as pessoas afirmavam (a afirmam) coisas que Marx desaprovava. E por isso que o marxismo tornou-se a verborrágia de hoje, sendo que o pensamento e conceitos de Marx passam desapercebidos. Marx foi muito ativo em sua militância; esteve em greves, passeatas, viagens, debates. Uma coisa mal-interpretada em Marx, principalmente pelos anarquistas, é a questão da propriedade. Ao discutir com Proudhon, Marx esclarece que o problema não é a propriedade, mas a propriedade burguesa; Marx acusou a frase de Proudhon "A propriedade é o roubo!" de contraditória, pois o roubo, como violação da propriedade, pressupõe a propriedade. Para Marx, o importante é analisar as formas concretas que a propriedade assume, e superar todas as formas de propriedade burguesa; portanto, Marx não se declara como inimigo da propriedade não por ser "reacionário", mas porque sabe que certos modos de propriedade interessam, como a propriedade coletiva da terra, por exemplo. Isso é muito importante, saber distinguir o que é de todos e o que não é de ninguém; o que é de todos deve responder aos anceios de todos, trabalhar por concenso, enquanto o que não é de ninguém não pode nem deve ser usado. Jogar lixo na rua, por exemplo: as pessoas o fazem e concentem que se faça por pensarem que a rua não é de ninguém, e o ato de jogar lixo na rua consiste em erro justamente pela rua ser de todos. As anarquistas acusam ainda Marx de autoritário, por defender a existência de um Estado Operário. Marx defendia o socialismo como etapa para a sociedade comunal (que é a comunidade desejada por socialistas e anarquistas) por acreditar que a força da burguesia se devia, principalmente, à sua organização, e portanto os proletários deveriam se organizar da mesma forma; Marx entendia que só poderia se combater organização com organização, Estado Burguês com Estado Operário, e preferiu a segunda opção. Um anarquista ucraniano (se não me engano), chamado Nestor Makno, chegou a conclusões parecidas, inaugurando o "anarco-plataformismo". Por último, foram os marxistas que legaram o rótulo de determinismo econômico e/ou de teoria política estratificada e dogmática ao marxista, e não o pensamento de Marx: quem leu "Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1884" sabe disso.

4 comentários:

Anônimo disse...

Tomara que Marx ainda sirva por muito tempo, se não servir mais significa que as coisas estão piores do que imaginamos...

Marcus César disse...

Boaaaaaaaaa

Unknown disse...

Ainda não li Marx. Nem seu texto, Alice.

Mas se quiser discutir (com) Argan, tô dentro!

Abraços saudosos.

Marcus César disse...

Quem Asmodeuses é "Argan"?